Pax Intratibus

20.9.06

Delírios Conscientes


Por lapso cometi um lapso um destes dias. Disse que o lince é um animal que já não existe, a não ser quando aparece um e então já existe. Um dia destes cometi um lapso por lapso. Disse que este Governo não existe, que é apenas uma invenção da eterna e enorme criança que há em mim. A criança errou, este Governo existe mesmo, mas ainda assim, recuso-me terminantemente a crescer. Eu ainda nem sei o que vou ser quando for grande (Deepak Chopra dixit). Crescer para quê?! Quando se cresce, muitas vezes acaba o arco-íris, o policromismo, o technicolor, cresce-se e fica-se encerrado numa enorme gama de cinzentos. O arco-íris fica escondido no branco que também está escondido no cinzento. Entende-se que tudo é mau a não ser que seja bom! Ou que tudo é bom a menos que seja mau. O que interessa se é bom ou mau? O que mais interessa é que eu sou! E eu, por lapso evolutivo, sou bom e mau, não-bom e não-mau. Sou! O que me interessa que alguém ou "alguéns" não queiram que eu assim seja se o vou ser da mesma forma (lembra José Régio e o seu Cântico Negro)? E já agora, o que me interessa a forma, a função e a estrutura se eu não sou Gestaltista (como o meu amigo Celtibérix), Funcionalista ou Estruturalista? Deixo essas coisas para os estudiosos que é função que amei, mas que hoje me enfada. Hoje prefiro sentir que estudar. Sentir o que só a minha essência única (aquilo que vulgarmente se designa por características individuais) consegue sentir. Analisar o que se sente é uma perda de tempo e da alma. Sente-se e pronto! Não quero com isto dizer que o racional é inerte ou inútil, claro que não! Por vezes temos de usar a nossa parte racional, mas devemos fazê-lo em desfavor da nossa parte emocional. Por sua vez, as emoções devem ser "usadas" em desfavor da nossa parte espiritual, do nosso imo, das profundidades do Mim onde se esconde a nossa gratitude, a nossa união com o Cósmico, o Universal, o Divino. Não vale a pena buscar fórmulas onde nunca as poderemos encontrar. As dos outros não nos servem, as do nosso Eu também não. Temos de recorrer às fórmulas do Mim, às não-categorizações, abandonar os nossos referenciais estafados pelo uso reflexivo, condicionado (que no entanto, valeu a Pavlov ser condecorado com a "Ordem de Lenine"). Tentemos ver tudo como se fosse a primeira vez que o observamos e sem fazer comparações ou colocar-lhe rótulos (Krishnamurti dixit).
Para começar vejam a mais-valia que isto é nas relações conjugais de fundo e meio-fundo, ver todos os dias a mulher com quem se vive como se fosse a primeira vez que a miramos. Ou olhar para o recibo do ordenado e vê-lo como algo novo todos os dias. Bom, penso que em ambos os casos as decepções talvez nos façam ter um enfarte, mas se não fizerem, com o treino e daqui a umas 20 ou 30 reencarnações a privarmo-nos do que gostamos, e a viver com o cérebro em estado alfa permanentemente, talvez consigamos. Mas que vale a pena tentar, isso vale. O que não vale é passar 2 ou 3 anos a olhar para uma parede em estado hipnótico e a tentar ver o que está para lá dela, se bem que eu perceba a finalidade deste tipo de Meditação no Budismo Zen, tradição Soto. Gosto mais da tradição Rinzai e dos seus magníficos "desarmadores" da razão, os "Koans"*. Afinal de contas a vida é tão bela que ninguém sairá vivo dela (alguém que não eu, disse esta frase).
*Koan = palavra japonesa que se pode traduzir como "exame das palavras" ou "análise das palavras". É usada no Budismo Japonês, o ZEN na tradição Rinzai. Consta, em regra, de uma afirmação ou interrogação racionalmente absurda. O mais conhecido é "Qual o som de uma única mão a bater palmas?" ou "o que vais fazer com essa pá que não tens nas mãos?". A finalidade é fazer a razão andar às voltas até que desiste, pelo que teremos uma consciência mais "apurada do real". Peço desde já desculpa aos puritanos, mas este não é um Blog de Budismo. Sei que muitíssimo mais há a dizer sobre isto. Talvez o faça um dia destes que não este.

12.9.06

Desencanto ao Sul

A Marcha da Maternidade, as greves gerais, as greves parcelares, as marchas Gay, as manifestações do PN (Partido Nacionalista) contra os Gays, as manifestações pró e anti-direito ao Aborto. Eis as pedras basilares dos 8 deputados do BE na Assembléia da República e também sérias dores de cabeça para os restantes portugueses. Porquê? Porque dividem um espaço geo-sociopolítico que já tem mais divisões que a mansão que o Tallon tem na Quinta do Lago. Atravessam-se crises após crises e em vez de se procurar a tão almejada união que permitiria, independentemente de quaisquer posições políticas, religiosas, psicossexuais, etc. a feitura de um esforço conjunto, faz-se precisamente o oposto. Criam-se cada vez mais compartimentações, divisões por onde se passa de uma para outra por portas pequeninas e estreitas.
Acho completamente aberrante, num País da UE as pessoas serem obrigadas a inventar formas de protesto contra o fecho de uma maternidade. Uma Maternidade! Mas o que é isto!!?? Mas onde vivemos? Então fazem-se estádios, "expos" e quejandos e fecham-se maternidades? E já agora, logo, amanhã, porque não as fecham todas e quando os rebentos quiserem sair dá-se um salto à Espanha.
Parece fácil, não é? Mas por algum motivo as tropas romanas do Imperador Diocleciano (o tal que chacinou Cristãos que lhe garantiram um lugar de luxo junto do cornudo e coxo (não, não é esse, falo do diabo)) dividiram esta zona da Península em Galiza, Lusitânia e Bética. Eram três realidades distintas. De todos e só por curiosidade os Galegos tinham o pior exército da Península. Se é para ser Espanhol então vamos fundo, faça-se um referendo, caso contrário, acabemos com estas farsas melodramáticas, ridículas "ad absurdum" e construa-se mais em vez de se fechar o pouco que temos.
A propósito de fechar e lembrando a questão das escolas do Concelho que não vão poder abrir a tempo, problema já resolvido em parte devido à boa-vontade do exército, lanço daqui uma ideia: Aproveitando a situação, porque não abrir uma filial dos Pupilos do Exército em Beja? Assim, fechavam-se todas as escolas do Concelho que o Estado venderia a retalho e poupavam-se uns chorudos Euros. O Exército ficava a ganhar, deixava de ter falta de voluntários e todos ficavam contentes, excepto os pais que não quisessem ver os filhos fardados e submetidos àquela disciplina castrense que faz falta em inúmeros casos. Falo das situações em que os pais batem nos filhos em legítima defesa. Mas o que é que está certo neste País? (dilatando uma afirmação da Trequita: "Mas o que é que está certo nesta cidade?").

5.9.06

Milan Kundera e o Estado Português

Lembro-me da primeira vez que li "O Livro do Riso e do Esquecimento" de Milan Kundera. Considero-o a sua melhor obra, seguido de perto pela "A Arte do Romance" e "A Insustentável Leveza do Ser" (ou será a insustentável leveza dos ordenados mensais?). Três grandes obras de entre o acervo de um grande escritor. Mas curiosamente 3 obras que deveríamos condensar apenas numa, apadrinhar e aconselhar aos estrangeiros com o seguinte título: "Livro da Ensinança de Mal Governar a Toda a Prova" (D. Duarte não se importava) e como subtítulo: "Compreenda a República Portuguesa e os seus últimos 15 Governos em apenas algumas horas". Sim! E tudo graças a um escritor checoslovaco, que se viu obrigado a férias compulsivas e a naturalizar-se Francês porque o Stalinismo proporciona a um escritor toda a liberdade criativa que ele queira exercer com a única condição de nunca contrariar as "verdades" (leia-se Dogmas) do Zé Estaline.
Há uma parte do "Livro do Riso e do Esquecimento" em que Kundera discorre acerca das historietas que os homens contam sobre os seus episódios com as mulheres. Então Kundera separa estes contos em 3 tipos: As mulheres que um homem teve (quase sempre as mais desinteressantes, mas de forma nenhuma sempre), as mulheres que um homem quis ter mas nunca conseguiu e aqui os motivos podem ser milhentos (estas são sempre muito interessantes e descritas aos amigos carregadas de mentiras e desculpas) e um 3º tipo muito estranho a que nem o Kundera consegue dar bem a volta. Seriam aquelas mulheres que nós queríamos e podíamos ter tido, que nos queriam e nos podiam ter tido, mas que nunca pudemos ter porque passaríamos o muro para o outro lado. Ou seja, perderíamos nessas mulheres a nossa identidade, desfazendo-nos e espraiando-nos como um rio quando entra no oceano. Seria um sacrifício incomportável. Entraríamos na ausência do "quem sou"? E "quem é ela"? Que Eu? Que Ela? Já imaginam a barafunda! (tão do agrado do Budismo, risos).
Num paralelismo livre com o Estado Português diríamos que o 1º tipo são as distorções do que supostamente temos, mas que afinal nem temos (tem a Eurozinc e outras grandes empresas estrangeiras) tudo isto enfeitado como se de um bolo se tratasse; é a história dos 2 e 2. Se for para receber são 22, se for para pagar são apenas 4; o 2º tipo "damos-lhe de calcanhar", aquilo que sempre quisemos mas nunca conseguimos! O que é isso para os portugueses tão habituados a este estado de coisas desde D. Afonso Henriques? Diria que esta 2ª categoria não existe para Portugal. É denegada, negada, recalcada (não, não vou falar dos vinte e tal mecanismos de defesa do Ego (risos)). É só ouvir um 1º Ministro Português a abrir a cremalheira e concluir pelas suas palavras que nós temos tudo, nada nos faltou, falta ou faltará! Do 3º tipo também estamos safos! Integrarmo-nos nas boas economias? Espraiarmo-nos na evolução económica e sócio-cultural dos Países do Norte da Europa? Mas o que é isso!? Isso são golpes baixos de um escritorzeco checoslovaco adulterado por um Abade duma Ordem obscura! Esses países nem estão melhor que nós! – referiu Zézinho Sócrates ao jornal Gazeta do Sobreiro Perdido. Repare, enquanto eles têm um problema com o dinheiro, nós os Portugueses estamos livres disso! O nosso problema neste Portugal é o tempo! Sim! O tempo e não o dinheiro! Os Portugueses têm montes de tempo para gastar o muito pouco dinheiro que têm! Por isso como se depreende desta minha ilação – continuou Zé Sócrates - só temos de resolver o problema do tempo em excesso. E já começámos: aumentámos a idade da reforma e queremos e vamos aumentar o número de horas semanais de trabalho. Com muito menos tempo desocupado, os Portugueses não terão oportunidade para gastar os "chorudos" ordenados que o Estado e/ou as Empresas lhes pagam.

Nota do Autor: Contactado por mim, Milan Kundera referiu nunca ter desconfiado de que um livro seu pudesse ser tão esclarecedor acerca do funcionamento de um País (se os Geógrafos fazem o que fizeram os Astrónomos e redefinem os mínimos a cumprir para se ser um País, ficamos mesmo uma Província da União Europeia). Disse-me também em 1ª mão que fará sair uma edição especial para o Estado Português que até poderá vir a ser psicografada pelo célebre medium alentejano "O Dadinho do Outro Mundo". O Maquiavel é que se lixou de vez em Portugal. A malta quer lá saber do "Príncipe", queremos é rir e esquecer. É um título para Portugal e os Portugueses. Ou rimos e esquecemos ou choramos e deprimimos profundamente. Romanceamos a vida porque com esta realidade não vai dando para singrar sem romance, sem lirismo, e neste aspecto os Portugueses são mesmo artistas, por isso há obrigatoriamente em cada Luso um Romancista em potência. A insustentável leveza dos ordenados só é contrariada pelo insustentável peso dos impostos. Chamemos aqui o grande Oscar Wilde que nos dizia: "Só há duas tragédias na vida: uma é não ter o que se deseja; a outra é obtê-lo.".
Como nós não temos o que desejamos e obtemos o oposto do que queremos esta frase só se nos aplica na primeira tragédia "Wildeana". Pelo que se conclui que a vida dos Portugueses não tem duas tragédias, mas apenas uma. Ah! País de gente sortuda, de características únicas e pardacentas...


 
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